Um megaprojeto de mineração de terras raras — conhecido como Projeto Colossus, operado pela empresa Viridis — está causando profunda preocupação na região da Serra da Mantiqueira, especialmente entre os moradores e ambientalistas de Águas da Prata (SP). Embora a atividade esteja oficialmente concentrada nos municípios mineiros de Caldas e Poços de Caldas, os impactos socioambientais ultrapassam as divisas estaduais, afetando diretamente os recursos hídricos, o equilíbrio ecológico e a saúde das comunidades vizinhas.
Terras raras: a nova fronteira das guerras silenciosas
A mineração em Poços de Caldas e Caldas, MG, concentra-se principalmente na extração de terras raras e outros minerais como bauxita, argila refratária e metais preciosos. A região possui um histórico de mineração de urânio, com a INB (Indústrias Nucleares do Brasil) tendo operado na área. Atualmente, projetos de mineração de terras raras estão em destaque, com a empresa Viridis Mineração e Minerais investindo em um projeto significativo na região.
A exploração de terras raras e urânio na Serra da Mantiqueira, por meio de projetos como o Colossus, vai além dos impactos ambientais e sociais imediatos — ela insere o Brasil no centro de disputas geopolíticas e militares globais. Em um cenário de reconfiguração das cadeias de suprimento e corrida armamentista, esses minerais são considerados insumos críticos para tecnologias de defesa, energia nuclear e sistemas bélicos de última geração. A crescente tensão entre potências como Estados Unidos, China e Rússia, somada à ameaça de novos conflitos armados e guerras tecnológicas, transforma territórios mineradores em zonas de interesse estratégico internacional. Com reservas de urânio e terras raras cada vez mais cobiçadas, o Brasil se vê exposto a pressões externas, riscos de militarização da política mineral e fragilidades na proteção de seus recursos soberanos. Ignorar esses fatores não é apenas negligenciar o meio ambiente, mas comprometer a segurança nacional diante de uma possível nova era de guerras por minerais estratégicos usados em tecnologia, veículos elétricos e sistemas de energia renovável e materiais bélicos.
Ameaça à água potável e ao lençol freático
O processo de extração de terras raras envolve o uso intensivo de produtos químicos para separar os minérios do solo — técnica conhecida como lixiviação. De acordo Michele Soares, Presidente da Brigada do Barranco e moradora de Águas da Prata, essa técnica representa uma séria ameaça ao lençol freático da região. “A água utilizada para a lavagem do minério será retirada da represa do Cipó, um dos mananciais mais importantes para o abastecimento regional”, alerta.
Destruição ambiental e risco de extinção de espécies
A área afetada inclui zonas de mata atlântica e cerrados preservados, abrigando espécies nativas em risco de extinção, como uma espécie de perereca rara identificada na área de intervenção — o que pode se tornar um ponto chave na tentativa de barrar o projeto junto ao Ibama e à FEAM. Além disso, grandes cavas de até 40 metros de profundidade serão escavadas, provocando impactos irreversíveis ao solo e à fauna local, onde ainda serão devolvidos os rejeitos, resíduos contaminados resultantes do processo de extração.
Problemas respiratórios e saúde pública negligenciada
A liberação de poeira tóxica e partículas no ar representa um risco concreto à saúde dos moradores, especialmente nos bairros da zona sul de Poços de Caldas, que estão diretamente na linha da chamada “zona de sacrifício” — sem previsão de evacuação nem contrapartida médica. “Não há cláusulas que garantam atendimento à população afetada. Só promessas vagas sobre geração de empregos”, critica Michele.
Falta de transparência e questionamentos ao licenciamento ambiental
As audiências públicas realizadas em Caldas e Poços de Caldas não contemplaram os impactos sobre Águas da Prata, conforme denunciam lideranças e especialistas. Daniel Tygel, físico da Unicamp, afirma que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) ignorou dados fundamentais e questiona a viabilidade técnica e ética do projeto.
Mobilização popular e resistência ambiental
Desde 2020, a Brigada do Barranco atua na linha de frente do combate aos incêndios florestais e à destruição ambiental na região. Agora, lideram com outras ONGs, como a Terra Viva Água Rara, um movimento de resistência que cresce a cada dia, contando com o apoio de universidades, técnicos ambientais e associações comunitárias. A coleta de assinaturas para barrar o projeto já está em curso e novas manifestações estão previstas.
Como se envolver
A população pode acompanhar o movimento e participar das ações através das redes sociais:
“Se a dor do outro não dói em mim, eu desconheço o que é amor”, afirma Michele, que vem sofrendo ataques e represálias por sua atuação. “A educação ambiental precisa ser vivida, e não apenas discutida quando vira emergência.”
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